Por Daniela Kfuri
A verdade é que toda a experiência, mesmo que pareça ruim a princípio, nos leva a novas oportunidades que a gente nunca chegou a pensar antes, e delas surgem ainda outros novos projetos e uma nova forma de ver o nosso mercado.
“Tropeçavas nos astros desastrada
Quase não tínhamos livros em casa
E a cidade não tinha livraria
Mas os livros que em nossa vida entraram
São como a radiação de um corpo negro
Apontando pra a expansão do Universo
Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
E, sem dúvida, sobretudo o verso
É o que pode lançar mundos no mundo.”
Livros – Caetano Veloso
Essa música do Caetano me emociona muito. Não só porque que fala da importância do livro, da cultura e da educação (lançar mundos no mundo), mas também de como ter livros ou livrarias em nossas cidades pode fazer diferença na vida das pessoas, visto que a realidade de muitos brasileiros é não tê-las. Este ano, em especial, tivemos que lidar com o fato de não ter livrarias abertas, além dos problemas de logística na maioria das cidades. Uma situação inédita para todos.
Nunca ficou tão claro como a gente precisa de e-books como nessa pandemia. Tivemos um grande aprendizado em diversas áreas da HarperCollins Brasil e fomos obrigados a acelerar várias frentes da editora, seja em contratos digitalizados, em amostras digitais para influenciadores e jornalistas ou em lançamentos online. Aceleramos uns 10 anos em 3 meses. Sem poder contar com as livrarias físicas, fechadas nesse período, fizemos, na Harper, algumas campanhas grandes com tutoriais para utilização de e-books, promoções de livros digitais, produção de conteúdo gratuitos especialmente para esse período e lançamentos exclusivos no canal digital. Enfim, tivemos que simular toda a experiência com livros físicos no ambiente virtual. E os resultados vieram, tivemos um crescimento de 40% nesse canal. Mas sem a possibilidade de comercializar e-books, seria muito mais complicado passar por esse tempo conturbado.
A verdade é que toda a experiência, mesmo que pareça ruim a princípio, nos leva a novas oportunidades que a gente nunca chegou a pensar antes, e delas surgem ainda outros novos projetos e uma nova forma de ver o nosso mercado. Lembro muito bem de quando os e-books começaram no Brasil. Havia um grande medo de que fosse acontecer com a indústria do livro o que aconteceu com a indústria da música. Fato é que hoje sabemos que o e-book não canibalizou o mercado. Pelo contrário, até ajudou. Em muitas estratégias de marketing, o ebook é fator fundamental e um diferencial para poder promover um livro. Tem gente que lê muito mais do que lia antes por causa do e-book, talvez pela facilidade de comprar ou pelos programas de assinatura. Tem gente que compra o físico, para pôr na estante, e o e-book para ler rápido. Tem gente, como eu, que usa o formato que for mais conveniente na hora desejada.
Ainda nesse período da quarentena nós, em conjunto com a Bookwire, aceleramos a produção de audiolivros, o que foi uma grande alegria e aprendizado dentro da nossa editora. Saímos de cara com obras muito promissoras como “Do mil ao milhão”, de Thiago Nigro, “Cristianismo Puro e Simples”, de C.S. Lewis, “Silêncio”, de Thich Nhat Hanh e “Liderança e Propósito” (um dos meus livros favoritos sobre gestão), de Fred Kofman. Em nossa campanha de lançamento queríamos que o consumidor pudesse ver as vantagens dos áudios como “Dirigir e aprender”, “Cozinhar e ouvir uma boa história”, “Se exercitar e estudar”, “Ler no escuro”, mas no fim das contas a gente queria colocar nas mãos do leitor a decisão de usar o formato que mais lhe agradasse (você pode ver o vídeo da nossa campanha no canal da Harper no youtube). Acredito que assim como aconteceu com o e e-book, e como tem acontecido em alguns países lá fora, o áudio será cada vez mais popular. Ainda mais num país como o Brasil, em que uma grande parte da população tem celular e onde os podcasts crescem enormemente. É mais uma forma de disponibilizar educação, cultura e conhecimento para mais pessoas, além de ser uma experiência prazerosa.
Cada vez mais fica claro que as editoras são editoras de conteúdo, não importa se será e-book, áudio ou livro físico. O resultado do sucesso de um conteúdo é a soma das frentes em que ele é rentável. As empresas têm que ser organizar para pensar tudo junto, até porque não temos um formato contra o outro, temos formatos complementares a serviço do leitor. Assim como o autor é a fonte de tudo, o leitor é a razão de tudo.
Essa semana a HarperCollins completou 5 anos no Brasil, apesar de ter 200 anos lá fora. Somos hoje, segundo a Nielsen, a quinta editora brasileira em interesse geral. Para comemorar fizemos uma série de programações em nossas redes sociais e tivemos a alegria de receber como parte dela Renato Noguera, lançando seu livro “Por que amamos” e Leandro Karnal, que está lançando o audiolivro “Pecar e perdoar”. Dentre todas as coisas lindas que foram faladas por eles, me marcou muito uma lembrança de Noguera sobre a profissão de livreiro. Ele fechou a live contando a história de seu pai, que era militar e abandonou a carreira para ser livreiro, para viver de livros e foi assim que ele se apaixonou pela leitura. Outro momento emocionante foi o agradecimento que o Leandro Karnal fez aos livros e à pessoa que o alfabetizou.
“Ler ajuda a pensar, ler dá força, ler anima, ler consola, faz companhia. Sem os livros, talvez eu não tivesse chegado a essa idade, sem os livros o mundo seria muito difícil. Viva a pessoa que me alfabetizou, que me deu esse presente. O grande conselho da vida é: leia com raiva, leia com amor, leia com tédio, mas leia sempre!”, Leandro Karnal
Viva a leitura e o conhecimento, seja no formato que for!
Daniela Kfuri é formada em Comunicação Social pela UERJ, possui MBA em Marketing e Pós-MBA em Marketing Digital pela FGV. Com mais de 20 anos de experiência, já trabalhou em agências de propaganda e nas áreas de marketing de empresas como Jornal do Brasil, Metropolitan e Estação das Letras. Em 2006, fundou o Departamento de Marketing da editora Objetiva, englobando os selos Alfaguara, Suma de Letras, Fontanar e Ponto de Leitura. Gerenciou campanhas de marketing de autores como Luis Fernando Verissimo, Mario Vargas Llosa, Carlos Ruiz Zafón, Martha Medeiros, Stephen King, Elizabeth Gilbert, Mario Quintana, Marcelo Rubens Paiva, Arnaldo Jabor, Augusto Cury, J. R. R. Tolkien, C. S. Lewis, Agatha Christie, Karin Slaugther, entre outros. Trabalhou no Grupo Companhia das Letras e no Grupo Ediouro. Foi finalista do prêmio Publishnews de melhor profissional de marketing e vendas do ano de 2016 e vencedora do prêmio no ano de 2018. Atualmente é Diretora de Marketing e Vendas da HarperCollins Brasil que engloba além da própria HarperCollins, as editoras Harlequin e Thomas Nelson.