Por Paulo Wassermann
A pandemia do novo coronavírus chegou com tanta força e de maneira tão impactante que a impressão é de que não sobraria nada. Passado o choque inicial, percebemos que era necessário nos reinventar, procurar outras formas de vender livros e conseguir pagar as contas.
Todo final de ano, durante as tradicionais trocas de cumprimentos com amigos e familiares, costumo dizer: “Espero que o próximo ano seja melhor que o atual e pior que o que virá depois dele”. É natural do ser humano achar que as coisas eram melhores no passado. Em parte, penso que isso se deve a um receio quanto ao que o futuro nos trará. O passado já conhecemos e, com a devida distância, conseguimos separar lembranças boas e ruins, independentemente de quando ocorreram. Mas e o futuro? Enquanto não inventarem uma máquina do tempo, será sempre um ponto de interrogação. Existem previsões de todo o tipo – políticas, esportivas, econômicas –, e grande parte delas mais erra do que acerta. O fato é que ninguém tem certeza de nada. E isso chegou ao limite extremo neste imprevisível, impensável e já inesquecível ano de 2020.
Particularmente para o mercado editorial brasileiro, o início deste ano pareceu catastrófico. Crises vêm e vão, mas os últimos anos pareciam sempre piores que os anteriores. Crise econômica, crise no varejo, vendas caindo, livrarias fechando, grandes redes em recuperação judicial e, sempre que a maré parecia se estabilizar, surgia outra onda mais forte que levava tudo embora. A pandemia do novo coronavírus chegou com tanta força e de maneira tão impactante que a impressão é de que não sobraria nada. Passado o choque inicial, percebemos que era necessário nos reinventar, procurar outras formas de vender livros e conseguir pagar as contas. Sem livrarias físicas, procuramos outros caminhos. O comércio eletrônico se intensificou e, ao que parece, os livros digitais ganharam novos adeptos.
O Grupo Editorial Summus sempre acreditou no futuro dos livros digitais. Ao contrário dos pessimistas e otimistas em excesso, nunca enxergamos esse formato como um substituto do livro impresso, mas como um novo meio de transmitir aquele mesmo conhecimento e uma forma de atrair novos leitores para o nosso catálogo. Começamos a vender eBooks no já distante ano de 2010, quando lançamos a coleção completa de Flávio Gikovate. Eu me recordo da dificuldade de entender os formatos, as questões de segurança e todo o processo de venda. Cada relatório recebido com poucas unidades vendidas era comemorado. Hoje, tudo isso já faz parte da nossa rotina. Praticamente 100% de nossos livros são lançados simultaneamente em formato impresso e digital. Trabalhamos constantemente nosso fundo de catálogo para renovar os contratos antigos e permitir que esses outros títulos fiquem disponíveis em eBook. Nosso objetivo, ainda um pouco distante, é ter o catálogo inteiro nesse formato. E nos últimos anos, com a ajuda da Bookwire, estamos presentes nas principais lojas – e colhendo bons resultados.
O fato é que, já no início da pandemia, com todos trabalhando em casa e fazendo reuniões pelo Zoom, percebemos que a saída era investir na venda digital dos impressos e na venda do formato digital. Era a única maneira de sobreviver ao maremoto. Em abril, cancelamos todos os lançamentos impressos, já que não teríamos onde vendê-los. Resolvemos lançar alguns títulos primeiro em eBook, algo que nunca tínhamos feito. Durante o ano, lançamos dois títulos exclusivamente em formato digital, um deles gratuito. Percebemos que, dependendo do livro, essa estratégia não prejudica em nada o lançamento do impresso. Muitas vezes, ajuda a despertar interesse pelo tema e pela versão impressa, para quem a prefere. Provavelmente, uma das lições da pandemia será estudar novas estratégias para que o digital contribua com a venda do impresso e vice-versa.
Alguns meses atrás, fui entrevistado para uma matéria de um portal de tecnologia cujo tema era “Ebooks e eReaders salvaram a indústria literária nessa pandemia?” Reproduzo parte do meu depoimento aqui. “Na nossa opinião, os eBooks não salvaram a indústria editorial. Mas ajudaram a amenizar o estrago na queda do faturamento com o fechamento das lojas físicas, assim como o comércio eletrônico. A venda de eBooks e a venda de impressos por comércio eletrônico tiveram um aumento considerável nesses primeiros meses de pandemia. No nosso caso, em abril e maio houve uma queda de 40% no faturamento total em comparação com o mesmo período de 2019. A venda por comércio eletrônico, que representava cerca de 15% do nosso faturamento, passou a representar 60%. Já com relação aos eBooks, houve um aumento de vendas considerável no mês de abril – cerca de 80% se comparado com os meses anteriores. Boa parte da venda física se deslocou para a virtual”. Passados alguns meses desse depoimento, já é possível verificar que o faturamento dos digitais permaneceu nos mesmos níveis nos meses seguintes. Claro que precisamos aguardar a vacina chegar e a situação aos poucos voltar ao normal para ter informações mais concretas. Mas, aparentemente, esse aumento na venda de eBooks veio pra ficar.
A situação ainda é crítica. A pandemia é realidade, e não tem data pra terminar. Enquanto isso, vamos buscando novos caminhos, investindo mais no digital e sobrevivendo. E desejando que 2021 seja muito melhor que 2020. E pior que 2022, 2023, 2024… Como diria Raul Wassermann, fundador do Grupo Editorial Summus – que este 2020 terrível e interminável também se encarregou de tirar do nosso convívio –, “o editor é um eterno otimista”.
Paulo Wassermann é formado em Propaganda e Marketing pela ESPM-SP e pós-graduado em Marketing Direto. Trabalha no Grupo Editorial Summus desde 1997, onde criou seu departamento de marketing, pelo qual é responsável até hoje. Coordenou a entrada das editoras do grupo no mercado de livros digitais. Em julho de 2020, assumiu a gestão da empresa.