Resultado da pesquisa produção e vendas com o olhar no digital

Por Mariana Bueno

Nos últimos cinco anos, o mercado de conteúdo digital apresentou crescimento de 158% em termos reais, representando 8% do faturamento das editoras. À primeira vista, essa representatividade pode parecer baixa, no entanto, para compreender o real significado deste dado, é necessária uma análise mais cautelosa, levando em consideração a dinâmica, as transformações e os desafios enfrentados pelo mercado editorial nos últimos anos.

Importante lembrar que desde 2019, ano em que a comercialização deste conteúdo passa a ser mensurada periodicamente, o mercado editorial brasileiro enfrentou inúmeros desafios, como a crise econômica e o consequente achatamento da renda média da população, o colapso das duas maiores redes de livraria, e uma pandemia. Não é pouca coisa, principalmente para um setor que enfrenta restrições de demanda, seja pela falta de capacidade leitora de parte da população ou pela falta de hábito de leitura daqueles que são capazes de ler. É partindo deste ponto que a análise deve ser construída. É neste cenário pouco positivo que o crescimento com a comercialização de conteúdo digital deve ser compreendido e que a representatividade de 8% passa a não parecer tão singela. Se em 2019 o faturamento nominal das editoras com conteúdo digital foi na ordem de R$ 103 milhões, em 2023 esse montante foi de R$ 339 milhões.

As diferentes formas de comercialização têm se mostrado viáveis e importantes para as mais diferentes editoras e modelos de negócio. Em 2023, as editoras faturaram R$ 162 milhões com as vendas à la carte, o que significa um crescimento de 78% em termos reais, em cinco anos. As editoras de CTP ficaram com 38% deste montante, os outros 62% são referentes aos livros de ficção e não ficção e foram abocanhados pelas editoras de Obras Gerais e Religiosos.

O desempenho das editoras de CTP com as vendas à la carte é significativo, mas o destaque fica por conta de Bibliotecas Virtuais. Em 2023, o subsetor ficou com 69% dos R$ 178 milhões faturados pelas editoras com “Outras Categorias” de comercialização de conteúdo digital. De 2019 a 2023, essa modalidade apresentou crescimento de 240%. A outra grande fatia ficou com as editoras de Didáticos, que faturaram R$ 46 milhões com Plataformas Educacionais. Para o subsetor de CTP essa forma de comercialização representa um ponto de inflexão, pois é com ela que as editoras obtêm o maior faturamento com a venda de conteúdo digital, que por sua vez tem segurado nos últimos dois anos as quedas nominais do faturamento dessas editoras com a venda de livros impressos. Ainda que com outra dinâmica, as editoras de didáticos podem estar trilhando este mesmo caminho.

Quanto aos formatos, o e-book apresenta maior predominância e representa 99% do faturamento das editoras com as vendas à la carte. Mas, ainda que a presença do audiobook seja tímida no país, é importante notar a importância do gênero não ficção para este formato, representando 63% do faturamento das editoras com as vendas à la carte e 85% do faturamento das editoras com as vendas por assinatura. É também nesta modalidade em que o formato áudio aparece com mais força, já que o e-book representa 66% do faturamento das editoras com assinatura e áudio, 34%. Neste sentido, é possível afirmar que o formato áudio se realiza e apresenta melhores resultados na categoria assinatura com o gênero não ficção.

Do lado do consumo, os dados completam essa análise. No último ano, 54% dos consumidores de livros compraram apenas livros impressos, 31% compraram tanto livros impressos quanto digitais e 15% compraram apenas livros digitais. 49% da classe A consome os dois formatos, impresso e digital. Já nas classes C/D e E, esse percentual é de 27%. Levando em consideração a última compra realizada, 71% dos indivíduos compraram livros impressos, 22% compraram livros digitais e apenas 7% compraram livros nos dois formatos. Daqueles que compraram livros digitais, 81% compraram e-book e 19% audiobook. Não Ficção para adultos lidera a lista de gêneros no formato digital, sendo a última escolha de 35,8% dos consumidores.

Tema ou assunto, Preço, Título do livro e Autor são os fatores que mais influenciaram essa escolha. 63% dos consumidores declararam que compraram livros digitais com desconto. Quanto ao dispositivo usado para a leitura, 50% declararam fazer uso do celular, no entanto, é importante notar que a maioria dessas pessoas pertence às classes C/D e E. Na classe A, 44% dos indivíduos declararam fazer uso de e-reader ou tablet. Algo semelhante ao que ocorre em outros países, como Alemanha e Inglaterra, onde o e-reader e o tablet são os dispositivos escolhidos por cerca 75% dos consumidores desses países. 

Portanto, pensar num país com baixa demanda por livros, com entraves estruturais de leitura e escrita, além de entraves às tecnologias, seja por falta de acesso e/ou por falta renda, que acabam por restringir o tempo de navegação na internet, ou impedem a aquisição de um tablet ou e-reader, a representatividade de 8% deve ser vista por outro prisma. E ainda que o crescimento do mercado digital seja mais lento do que certas projeções, ele segue sendo persistente, consistente e vem se mostrando uma boa alternativa no enfrentamento das intempéries do livro impresso.


Mariana Bueno é formada em economia pela PUC-SP e possui MBA em Inteligência Estratégica, Competitiva e Econômica pela FIPE-USP. É coordenadora de Pesquisas Economicas da Nielsen BookData.

Há mais de uma década esta à frente da pesquisa “Produção e Vendas do Setor Editorial Brasileiro” e da “Série Histórica” deste estudo, que mostra o comportamento do mercado editorial em termos reais.

É também responsável pela condução das pesquisas “Conteúdo Digital do Setor Editorial Brasileiro”, “Panorama do Consumo de Livros” e “New Zealand Publishing Market Size Report”, relatório desenvolvido pela Publishers Association of New Zealand em parceria com Nilsen BookData NZ. É colaboradora do blog da CERLALC, membro da comissão técnica da pesquisa “Retartos da Leitura” e nos últimos anos vem se dedicando a estudar o desempenho do mercado editorial brasileiro e de outros países e de que forma esse mercado impacta o desenvolvimento socioeconômico. 

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