Por Thereza Castro

No âmbito do mercado editorial, a IA sinaliza a possibilidade de ofertar ao leitor uma experiência cada vez mais individualizada; e ao setor, especialmente no digital, a chance de otimizar procedimentos cruciais como a criação de metadados enriquecidos, além de ampliar o alcance a públicos diversificados.
Durante o ano de 2023, pensei muito na frase de Andrew Ng, proferida em 2007, sobre a IA ser a nova eletricidade, isto é, uma força motriz capaz de remodelar todos os setores. As ferramentas generativas estavam se popularizando, e vi como essa visão fazia sentido — sem, é claro, esquecer dos importantes debates ético-legais que emergiam.
Contudo, anos antes disso, Ray Kurzweil, um dos mais influentes intelectuais sobre tecnologia e futuro, já explorava o tema. Com uma trajetória dedicada à inovação e participações em conselhos consultivos de corporações como o Google, Kurzweil tem previsto o futuro tecnológico com notável precisão desde os anos 1990.
Seu mais recente livro, A Singularidade está mais próxima, lançado no final de 2024 pela Editora Goya e também disponível em formato digital, apresenta projeções impactantes para as próximas três décadas e revisita o conceito da Singularidade: a integração biológica com a IA por meio da nanotecnologia, expandindo a capacidade cerebral humana a patamares inéditos até o final da próxima década.
Kurzweil, conhecido por seu otimismo, contrapõe apreensões sociais, recordando a tendência humana a crer equivocadamente que o passado é superior ao presente.
Um dos pilares de sua obra é a Lei dos Retornos Acelerados, que descreve a evolução exponencial da capacidade computacional a custos decrescentes, traduzindo-se em maior poder de processamento por dólar e, consequentemente, democratizando o acesso a inovação. Ao discorrer sobre essa progressão, o autor estabelece uma analogia perspicaz com a invenção da prensa, que popularizou a informação e deflagrou futuras revoluções sociais.
Para Kurzweil, IA e informação estão intrinsecamente ligadas, pois a inteligência artificial proporciona uma capacidade ampliada para processar e gerar dados — acelerando o avanço em diversas searas do conhecimento.
No âmbito do mercado editorial, a IA sinaliza a possibilidade de ofertar ao leitor uma experiência cada vez mais individualizada; e ao setor, especialmente no digital, a chance de otimizar procedimentos cruciais como a criação de metadados enriquecidos, além de ampliar o alcance a públicos diversificados. Adiciona-se a isso a captação e análise de um grande volume de dados proporcionando insights valiosos para a promoção do livro e a formação de novas audiências, desde a identificação de nichos de mercado até a compreensão dos hábitos de leitura o que certamente fomentará modelos de negócios disruptivos impulsionados pela tecnologia.
Não obstante, essa metamorfose também suscita importantes debates éticos no contexto editorial e para além dele. Questões como a proteção dos direitos autorais, o potencial para vieses algorítmicos e muitas outras emergem como pontos cruciais de discussão. O próprio Kurzweil não se furta de se debruçar sobre os impactos e desafios que iremos enfrentar, sublinhando a importância da regulação, dos valores éticos e da manutenção da humanidade como centro dentro das políticas públicas.
Em suma, devemos evoluir incorporando a tecnologia, mas também zelando por sua aplicação criteriosa, a fim de que ela seja sempre positiva e coerente com nossos valores mais profundos. Para aqueles que desejam vislumbrar as ondas do futuro, beber dessa e de outras fontes é expandir a compreensão, fomentar o debate e contribuir com a construção do amanhã, afinal somos nós, sociedade, que edificamos a tecnologia em última instância, com nossas decisões e usos dela.
Thereza Castro é atualmente coordenadora de marketing do Grupo Editorial Aleph. Advogada por formação, sua atuação profissional concentra-se em direitos autorais e estratégia de inovação para o mercado editorial. Formada em Direito pela FMU e pós-graduada pela PUC/SP, ela também cursou liderança feminina na Nova SBE de Portugal e liderança em inovação na Universidade Hebraica de Jerusalém, instituição reconhecida como um dos maiores polos tecnológicos globais. Além disso, integra o Comitê de ESG da Câmara Brasileira do Livro (CBL).