Em defesa do direito de escolher como ler

Por Lu Magalhães

Diante da pandemia, como o contexto do momento impactou a nossa relação com a leitura? Acredito que muito! A experiência de medo e incerteza impulsionou, para muitos, a busca por leituras qualificadas e que permitissem uma reflexão mais profunda do existir

Em 2018, tive o privilégio de acompanhar o South by Southwest (SXSW) – festival de música, tecnologia e interatividade, que acontece na cidade de Austin, nos Estados Unidos – uma edição pautada pela preocupação das empresas em avaliar os impactos sociais gerados pela tecnologia. Do meu recorte de mundo, impossível não pensar nas mudanças comportamentais que alteraram a nossa relação com os livros. Os dispositivos de leitura para obras digitais, os tablets e smartphones, ampliaram horizontes seja pelo custo – ficou mais barato adquirir um livro –, seja pela comodidade de ter sempre um exemplar por perto. Passados dois anos, retorno à essa reflexão, agora sob a perspectiva da pandemia.

Antes, cabe ressaltar que inovação e tecnologia no mercado editorial não chegam a ser uma novidade do nosso século. A trajetória do livro sempre foi marcada pela evolução gráfica desde Gutenberg; avanço, inclusive, que permitiu o acesso de mais pessoas ao livro. Diante dessa perspectiva histórica, a convivência dos livros com novas tecnologias sempre apresentou uma aventura extraordinária – na ferramenta de leitura e no modelo de negócio.

Da mesma forma que há um livro certo para o momento certo, há uma maneira de ler perfeita para cada tipo de leitor. Há momentos de adorar a praticidade de um digital; há outros de tocar, marcar e cheirar um livro impresso. Há, ainda, o audiolivro que é um sucesso nos Estados Unidos e tem conquistado o leitor brasileiro. Mas, diante da pandemia, como o contexto do momento impactou a nossa relação com a leitura? Acredito que muito! A experiência de medo e incerteza impulsionou, para muitos, a busca por leituras qualificadas e que permitissem uma reflexão mais profunda do existir. Para outros, ela funcionou como válvula de escape em um momento tão singular e distópico. Aliás, romances como 1984, Admirável Mundo Novo e Ensaio sobre a Cegueira estão entre as obras mais procuradas nesse período, de acordo com pesquisa realizada pela GfK.

Sobre como consumir os livros, no auge do distanciamento social e diante da impossibilidade de comprar diretamente nas livrarias, os leitores brasileiros passaram a adquirir mais e-books. Na perspectiva da Primavera Editorial, essa constatação nos trouxe a convicção de estarmos no caminho certo, isso porque, desde 2015 passamos a fazer a conversão do catálogo de títulos para o digital; para os novos títulos, optamos por lançamentos de versões impressas e on-line. Hoje, com mais de 80 obras no portfólio digital, registramos quase cinco mil downloads da obra O livro dos negros, em apenas 12 dias. Esse, aliás, foi o primeiro título a integrar uma ação de marketing da editora, desenhada exclusivamente para o período de quarentena.

O aumento nas vendas de dispositivos eletrônicos de leitura nos últimos anos fez com que eu decidisse investir no lançamento e conversão do catálogo da editora para atender a esse público crescente. Além da versão digital, nos dedicamos a ampliar o portfólio de audiolivros – mesmo quando as editoras não estavam dispostas a investir nessa estratégia. Fomos na contramão e hoje temos um catálogo sólido e diverso. Essa decisão está alinhada à minha defesa de que a liberdade de escolha do consumidor é um valor importante. É essencial que o leitor tenha essa oportunidade de escolher em qual plataforma quer ler.

Na prática, há 15 anos temos feito um trabalho que tem por objetivo dar ao leitor de língua portuguesa opções de obras em diferentes plataformas – do impresso ao on-line. A nossa estratégia sempre foi pautada pela proposta de estreitar relacionamento com os leitores; dialogar com eles. A opção de responder ao momento da pandemia, oferecendo download gratuito do primeiro capítulo de títulos em fase de pré-venda, é parte desse diálogo. Ao ter acesso a esse conteúdo gratuito, esse leitor fica curioso em saber mais sobre a Primavera Editorial e se sente instigado a adquirir mais obras. A partir daí, ampliamos a nossa presença na vida dessa pessoa. Essa é a nossa forma de trabalhar e de colaborar para termos um Brasil cada vez mais leitor.


Lu Magalhães é presidente da Primavera Editorial, sócia do PublishNews e do #coisadelivreiro. Graduada em Matemática pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), possui mestrado em Administração (MBA) pela Universidade de São Paulo (USP) e especialização em Desenvolvimento Organizacional pela Wharton School (Universidade da Pennsylvania, Estados Unidos). A executiva atua no mercado editorial nacional e internacional há mais de 20 anos.

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