Papel e preconceito

Por Mark Carpenter

No nosso trabalho na editora Mundo Cristão, compreendemos o apelo do livro em papel, mas também tomamos o cuidado de produzir versões digitais de todos os lançamentos e audiobooks dos livros mais populares

Estou casado há décadas com Laurie. Ao contrário daquilo que faz acreditar a sabedoria popular, neste tempo não nos tornamos cópias um do outro. Continuamos com personalidades distintas, gênios desiguais e preferências próprias. Aprendemos juntos a negociar pequenos acordos e acomodações para dar espaço às propensões e jeitos de ser de cada um. Posso dizer sem sentimentalismo que a influência dela tem feito de mim um ser um pouco mais empático e menos egoísta. A vida ao lado dela é sempre cheia de novas descobertas.

Entre nossas diferenças estão as preferências literárias. Somos ecléticos e dispostos a novas experiências, mas frequentemente ela escolhe um clássico, enquanto eu sou mais propenso a optar por algum autor contemporâneo. Alinhamos nossas leituras apenas nas páginas da Bíblia, da espiritualidade clássica e dos livros sobre causas que defendemos em conjunto.

Estes dias decidi interromper minha pilha de leituras futuras para enxertar uma diferente — Orgulho e preconceito, de Jane Austen. Há muito tempo havia percebido que Laurie habita um universo austeniano que enriquece sua vida e sobre o qual pouco conheço. Chegara a hora de entrar como intruso neste mundo. Baixei uma boa versão para Kindle e comecei uma leitura imersiva, com o Raio-X ligado para me ajudar a acompanhar a identidade dos personagens e localidades, observando os destaques escolhidos por outros leitores e com o onipresente dicionário do Kindle para tirar qualquer dúvida sobre termos arcaicos do século 19. Se a leitura dos livros me ajuda a mergulhar num universo desconhecido, o uso de todas as ferramentas do Kindle expande este universo e monta um contexto que amplia e dinamiza a experiência. Vou terminar o livro em alguns dias. Ainda pretendo surpreender Laurie com algum comentário perspicaz sobre Mr. Darcy e Elizabeth Bennet. Espero que ela retribua, encarando um Murakami.

Leio ebooks no meu Kindle PaperWhite e no Kindle para iPhone. Para ser sincero, aprecio muito a experiência de ler em papel. A natureza sensorial e tátil do livro impresso é única, assim também como a sensação de progresso na leitura. Observar o cuidado no design da capa, das orelhas, do projeto gráfico e da diagramação — tudo contribui de modo singular para a absorção até do conteúdo do texto. Mas é inegável que o ebook traz vantagens. Além da facilidade do acesso, da armazenagem e do transporte, as tecnologias do ebook garantem que o livro está sempre próximo. Ler um ebook me da a sensação de estar lendo em comunidade. Não sou só eu, escondido numa poltrona num canto da sala. Os ebooks nos dão sinais de que outros leitores estão à nossa volta.

Ler o livro digital, então, é categoricamente diferente de ler de outra forma. Lemos o livro impresso como marujos isolados em ilhas desertas. Mas lemos o ebook com a certeza de ter à disposição a caixa preta e todas as informações paralelas e adjacentes. Não há nenhum perigo em não entender, não lembrar, não contextualizar. No entanto, se para alguns o ebook é mais satisfatório por ser mais prático e por situar o livro no seu mundo, para outros parte do charme de ler em papel envolve o risco de às vezes não entender e de se perder num mistério de dúvida ou deslumbramento sem razão.

A resistência do livro impresso surpreendeu todos os prognosticadores dos últimos vinte anos. Como a tecnologia não iria suplantar este dispositivo tão primitivo? Carolyn Reidy, recém-falecida CEO e presidente da Simon & Schuster, afirmou numa palestra em Frankfurt em 2017 que o ebook não havia desbancado o livro impresso pois “ainda não foi inventado”. Afirmou que o modelo atual dos aparelhos leitores de livros digitais ainda está muito distante daquilo que tecnologias futuras trarão — artifícios que levarão a sério as características únicas dos livros impressos, entregando ao usuário uma experiência igualmente satisfatória do ponto de vista estético e sensorial. Difícil imaginar o que ela tinha em mente, mas enquanto esta nova tecnologia não surgir, os livros impressos preservarão seu domínio no mercado.

No nosso trabalho na editora Mundo Cristão, compreendemos o apelo do livro em papel, mas também tomamos o cuidado de produzir versões digitais de todos os lançamentos e audiobooks dos livros mais populares. Especializamos na publicação de obras sobre espiritualidade cristã, e assim sabemos que tudo que editamos é lançado para um universo onde boa parte dos leitores compartilham de uma visão de mundo cristã. Nossas obras conversam entre si, e todas fazem referência implícita- ou explicitamente à Biblia. A leitura das nossas obras pelas plataformas digitais facilita estas conversas e contribui para a educação e o progresso da nossa comunidade.

Se até a pouco tempo o mundo dos leitores se dividia entre leitores de impressos e digitais, hoje se consolida uma consciência de que há espaço para cada plataforma, e que cada uma traz benefícios peculiares, a depender do tipo de leitura pretendida. Ao constantemente expandir suas conexões e seu network, a Bookwire nos ajuda a construir e interligar esta comunidade de leitores, que envolve não apenas cristãos mas também aqueles que estão descobrindo a relevância de escritores cristãos novos e antigos para uma compreensão da dinâmica espiritual da nova realidade cultural, social e política que está transformando nosso País e nosso mundo.


Mark Carpenter é presidente da editora Mundo Cristão, fundada em 1965 e especializada em livros sobre cristianismo e espiritualidade clássica. Bacharel pela Bethel College (Indiana, EUA); mestrado em letras modernas pela FFLCH/Universidade de S. Paulo. Atuou como presidente dos conselhos da Media Associates International, Pan American Christian Academy e Associação de Editores Cristãos. Membro do conselho editorial da Publishing Research Quarterly (Springer Sciente+Business Media).

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