Por Gil Sales
O livro digital, em vez de ser o “bicho papão” do livro impresso, tem se mostrado o Huckleberry Finn de Tom Sawyer ou o Watson de Sherlock Holmes: um complemento inseparável e fundamental para o sucesso de uma história.
É impossível negar: a pandemia foi e tem sido um acontecimento terrível para a humanidade, ceifando vidas, prejudicando a saúde de muitos e causando uma crise sanitária sem precedentes. Disso ninguém deveria ter dúvidas. Mas ela nos trouxe algumas valiosas lições também. As pessoas precisavam (e seguem precisando) ter acesso a livros, seja para se informar, estudar ou se entreter. Se o fator pandemia nos obrigou a rever a logística “analógica” de compra e venda de livros, exigindo alternativas para a compra sem sair do necessário isolamento social, a tecnologia, por sua vez, nos salvou. Sim, nos salvou oferecendo possibilidades múltiplas para quem quer ler um bom livro simplesmente baixando (legalmente) por meio de seu dispositivo digital preferido. E isso não é pouco. Não mesmo!
Até 2020, o catálogo de literatura da Editora do Brasil (o qual tenho muito orgulho de gerenciar) não era amplamente digital. Tirando uma solução ou outra para atender demandas específicas, nunca tínhamos conseguido efetivar de modo tão abrangente esse passo necessário rumo à digitalização de nossos títulos. Então, esse conforto de estar em Dubai ou em Berlim e ainda assim poder desfrutar de um livro da Editora do Brasil não era uma realidade até ano passado. Com muitos temores, mas também com muita vontade, assumimos esse desafio e nos juntamos à Bookwire para dar esse salto. E voilá!, aqui estamos nós com nosso catálogo de mais de 400 títulos quase inteiramente disponível em epub para leitores do mundo todo.
Foi um ano de muitas aprendizagens, decisões, recomeços, receios, surpresas e alegrias. Com todo o suporte que tivemos da tecnologia e o comprometimento advindo dessa parceria, afirmo que viemos para ficar nesse universo digital. Com a cooperação e o entusiasmo de nossos autores e de nossos fornecedores e colaboradores realizamos um feito e tanto, colocando no ar em poucos meses um catálogo robusto.
Passado o período inicial de adaptação, hoje em dia não conseguimos imaginar fazer um livro impresso sem pensar em seu equivalente em formato digital. Virou já algo natural pensar todos os nossos lançamentos “estreando” junto do impresso (ou até mesmo antes) nas diversas plataformas digitais. Uma grande emoção ver um autor divulgando um livro recém-lançado e, no minuto seguinte, um seguidor amigo postar um comentário informando que já comprou a versão em e-book, quase que instantaneamente. É a mágica da tecnologia que facilita tantos caminhos…
Há muito o que melhorar, claro, mas nossa experiência nos diz que todos os esforços que empenhamos para isso têm valido a pena. O investimento em tecnologia é necessário e urgente e deveria ser incentivado cada vez mais, para que mais e mais editoras consigam dar esse passo e oferecer a seus leitores o universo de possibilidades que o mundo digital abre.
Como editores preocupados em estar onde o leitor está, é uma verdadeira alegria vivenciar essa transformação e ser parte de algo tão grandioso e abrangente como é esse fato aparentemente simples de estarmos acessíveis em diversas plataformas, a um clique. E isso tudo sem deixar de seguir apostando no livro impresso, sem sair tanto do caminho convencional que trilhamos, tal como várias editoras brasileiras, para chegar até aqui e poder dizer a nossos leitores (escolas, famílias, crianças e jovens) que eles podem adquirir nossos livros a qualquer hora do dia e em qualquer lugar do mundo.
Somos uma empresa de quase 80 anos, mas com uma atuação calcada no futuro que está logo ali, dobrando a esquina, nos esperando ansioso. É importante demais que estejamos preparados para ele. Sem tecnologia de ponta, isso não seria possível. O livro digital, em vez de ser o “bicho papão” do livro impresso, tem se mostrado o Huckleberry Finn de Tom Sawyer ou o Watson de Sherlock Holmes: um complemento inseparável e fundamental para o sucesso de uma história.
Gil Sales é gerente editorial de literatura e não ficção na Editora do Brasil. Bacharel e licenciado em Letras pela USP, atua há 14 anos com livros. Trabalha lendo e relaxa… lendo (claro!).
